Olha! Recife no Rio e Olha! Recife Literário - um dia inteiro de cultura, história e poesia pela cidade
- Danielle Lins

- 15 de out.
- 6 min de leitura
Atualizado: 16 de out.
Dois passeios em um só sábado: do Capibaribe às memórias de Manuel Bandeira, entre pontes, poesias e descobertas pelo Recife
Semana passada, contei aqui no blog sobre minha primeira experiência no Olha! Recife, quando participei do passeio a pé Recife Árabe. Foi tão interessante que, dessa vez, decidi dobrar a dose: fiz dois passeios no mesmo dia, o Olha! Recife no Rio e o Olha! Recife de Ônibus Literário – Manuel Bandeira.
Um sábado de imersão na cultura, na história e na poesia que moldam a alma da nossa cidade.
Olha! Recife no Rio — Recife e suas pontes
A Secretaria de Turismo e Lazer do Recife realiza semanalmente os passeios turísticos gratuitos e guiados pelo programa Olha! Recife. As inscrições para o Olha! Recife no Rio e Olha! Recife no Ônibus abrem sempre às quintas-feiras, às 9h da manhã, no site olharecife.com.br. Mas atenção: as vagas são altamente disputadas! É preciso estar logado no horário exato para garantir seu lugar.
No dia do passeio de catamarã, inclusive, havia fila de espera, algumas pessoas aguardavam no local torcendo por desistências.
Os detalhes sobre o processo de inscrição estão no post anterior “Descubra o Olha! Recife: meu passeio a pé pelo Recife Árabe e suas curiosas influências na cidade”.
O passeio “Recife e suas pontes” parte pela manhã do Catamaran Tours, próximo ao Forte das Cinco Pontas, no bairro de São José, e tem duração média de 1h30. São cerca de 100 vagas por saída, por isso chegue com antecedência: há fila para embarcar e escolher o assento, e os lugares centrais não têm cobertura, um desafio em caso de chuva.
Durante o trajeto, o guia compartilha curiosidades, histórias e lendas da cidade de forma leve e divertida, com direito a música, brincadeiras e aplausos a cada ponte. É impossível não se deixar envolver pelo clima festivo e pela beleza das águas do Capibaribe.
O percurso segue em direção ao coração do Recife, passando por pontos emblemáticos como o Parque de Esculturas Francisco Brennand, o Marco Zero, o Porto do Recife, o Teatro de Santa Isabel, a Rua da Aurora, pelas três ilhas centrais (Santo Antônio, Recife Antigo e Boa Vista).
A única parada é no Parque de Esculturas Francisco Brennand, onde é possível desembarcar por alguns minutos para observar as obras e registrar fotos. O guia permanece no catamarã, então o passeio pela área é rápido, eu fui porque minha mãe ainda não conhecia.
Uma curiosidade: o passeio não contempla explicações sobre as obras do Parque nem contextualização histórica no local — um ponto que senti falta e que poderia enriquecer ainda mais a experiência. Caso queira algo mais completo, há os passeios pagos do Catamaran Tours.
Durante o trajeto, passamos sob as Pontes do Limoeiro (originalmente era ponto de passagem de trens da ferrovia que ligava o Recife a Limoeiro), Princesa Isabel (a primeira ponte de ferro do Recife que abrigava tubulações que levavam água para os bairros), Duarte Coelho (é a ponte mais antiga com 292 metros que demorou 10 anos para ser construída) e Boa Vista (conhecida como Ponte de Ferro que liga os bairros da Boa Vista e Santo Antônio), cada uma com sua história e simbolismo que fazem do Recife uma verdadeira Veneza brasileira.
A cada ponte, o guia nos convidava a fazer um pedido e aplaudir, uma tradição divertida que arrancou risadas dos passageiros.
Entre as paisagens, avistamos o painel de Eduardo Kobra na fachada da Prefeitura, um mural de 80 metros que retrata Luiz Gonzaga, o Marco Zero, o Teatro de Santa Isabel, a Assembleia Legislativa e o casario colorido da Rua da Aurora.
Um passeio encantador, ideal para quem quer ver o Recife sob uma nova perspectiva, pelas águas e pelas histórias.
Olha! Recife de Ônibus Literário - Manuel Bandeira
À tarde, seguimos para o segundo passeio do dia: o Olha! Recife de Ônibus Literário, com o tema Manuel Bandeira (1886–1968). O ponto de encontro é o Posto de Informações Turísticas, na Praça do Arsenal, em frente ao Paço do Frevo.
O roteiro celebra a vida e a obra de um dos maiores poetas brasileiros, autor do icônico poema Evocação do Recife, que retrata com ternura a cidade onde viveu parte da infância. A condução ficou por conta da guia Cristina Schirmer (a mesma do passeio Recife Árabe), que com entusiasmo e bom humor transformou o trajeto em uma verdadeira aula de literatura viva.
Primeira parada: a casa onde o poeta nasceu
O percurso começa na Rua Joaquim Nabuco, na área da Capunga, no bairro das Graças, onde fica a casa em que Bandeira nasceu. Hoje o imóvel está fechado e passou por algumas modificações, mas ainda guarda traços do passado. Segundo a guia, houve tentativas de transformá-lo em centro cultural, o que infelizmente ainda não se concretizou.
Em seguida, percorremos a rua vizinha, Fernando Lopes, onde casarios antigos e silenciosos com portas e janelas de madeira remetem a um Recife mais bucólico. Durante todo o trajeto, Cristina compartilhava detalhes curiosos sobre o poeta: nasceu em uma família dona de engenhos de cana-de-açúcar, mas vivia dependendo do dinheiro do pensionato administrado pelo pai, sua saúde frágil, a tuberculose que o afastou de uma vida convencional, a paixão por doces (especialmente papo de anjo, doce típico português à base de ovos), e a vida amorosa intensa, embora nunca tenha se casado.
Segunda parada: Sertãozinho da Caxangá e a casa da família Gouveia
Um dos momentos mais marcantes foi a passagem pela Rua Francisco de Paula, no bairro da Caxangá, região conhecida como “Sertãozinho”, mencionada por Bandeira em seus versos. Lá ainda resistem antigas residências de arquitetura da época com fundos voltados para o Capibaribe.
Entre elas, o casarão da família Gouveia, antigo lar de Heleno Fonseca de Gouveia, proprietário e diretor do jornal Diário da Manhã, que faleceu em 2002. O antigo palacete é lembrado como residência histórica da família e símbolo da imprensa pernambucana, além de representar um tempo aristocrático do Recife.

O jornal Diário da Manhã foi fundado em 16 de abril de 1927, originalmente pertencente à família Lima Cavalcanti. Em 1962, Heleno de Gouveia assumiu a direção do jornal, que passou por transformações, inclusive na forma de circulação. Houve um período em que as edições eram disponibilizadas em placas fixadas em postes, funcionando como um jornal mural. Após a morte de Heleno, tanto a casa quanto a direção do jornal permaneceram sob os cuidados da família Gouveia, sendo a filha Beatriz Helena F. de Gouveia quem assumiu a direção do periódico.
Durante o passeio, uma das filhas do proprietário chegou a conversar com a guia, da sacada da janela, lamentando que a região “já não é mais como antigamente”.
Por serem propriedades privadas, não tivemos acesso ao interior das casas, mas foi emocionante imaginar o cenário que inspirou os versos de Bandeira.
Espaço Pasárgada - o Recife em poesia
A próxima parada foi o Espaço Pasárgada, na Rua da União, bairro da Boa Vista, antigo casarão do avô de Bandeira, onde o poeta viveu dos seis aos dez anos. Tombado e mantido pela Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) desde 1983, o espaço abriga acervo, biblioteca e atividades literárias, sendo ponto de encontro de escritores e pesquisadores.

Infelizmente, não foi possível visitar a parte interna, pois o local abre apenas de segunda a sexta — mas eu já havia estado lá na época da faculdade de Jornalismo.
Ali, o poema Evocação do Recife ganha vida:
“Rua da União onde todas as tardes
Passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa...”
Cristina recitou os versos no ônibus, emocionando todos os presentes. Ela lembrou que, apesar da forte ligação de Bandeira com o Recife, a maior parte de seu acervo está no Rio de Janeiro — um dado que reforça a importância de valorizar mais o legado literário local.
Estátua de Manuel Bandeira, na Rua da Aurora
O passeio termina diante da estátua do poeta, às margens do Capibaribe, na Rua da Aurora. O entardecer colorido sobre o rio foi o cenário perfeito para encerrar o roteiro — uma despedida poética e nostálgica.
Apesar da beleza do passeio, é lamentável que, mesmo após 139 anos do nascimento do poeta e 39 anos da fundação do Espaço Pasárgada, ainda não exista um museu dedicado à sua memória. O poder público precisa olhar com mais atenção para o patrimônio literário pernambucano.
Um sábado de descobertas
Foram muitas emoções em um único dia: manhã nas águas do Capibaribe, tarde entre versos e memórias. Esses roteiros do Olha! Recife são uma verdadeira oportunidade de reconectar-se com a cidade, enxergando-a com novos olhos, seja pelas pontes, seja pela poesia.
E você, já participou de algum passeio do Olha! Recife? Qual roteiro me recomenda para a próxima aventura? Deixe nos comentários!
Ah! E confira a entrevista completa com a guia Cristina Schirmer no meu canal do YouTube, no quadro “Pausa Cultural em Recife”.
Um beijo,
fique com Deus e até o próximo post!
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